Manu

Eu penso no teu rosto.

Eu penso em você me perguntando sobre ciências e outras curiosidades.

Eu penso em você sentada assistindo filmes de herói comigo.

Em nossa viagem, você ficou com medo do avião. Você faz malcriação. Eu compro seu doce favorito. Seu sanduíche predileto.

Busco você na escola. Te espero de longe para você não passar vergonha.

O tempo passa rápido. Você cresceu e nós tivemos uma vida que valeu a pena.

Eu sei, nós nunca nos vemos. Isso nunca aconteceu.

Mas, eu sinto sua falta. Um pedaço de mim se foi. Um pedaço de nós se foi.

Não foi, na verdade. Está no meu coração, na minha alma.

Que saudades de você, Manoela.

Velhos desconhecidos

Aconteceu:

Do nada, alguém fala comigo na rua, estendendo a mão:

– E aí? Tudo bem? Quanto tempo, cara!

Respondi:

– Opa! Tranquilo!

E, de forma efusiva, falando alto, o transeunte continuou:

– Tu tá bem, rapaz…! Eu também tô! Que foda né? Bom te ver! Felicidades! Ah, moleeeeeeeque!

Após me dar soquinhos na altura do ombro tal qual velhos amigos fazem, o sujeito foi embora e só deu tempo pra eu balbuciar:

– Safo…

Infelizmente, todo esse calor humano foi inócuo. Eu não faço a menor ideia de quem seja.

Indecência

Shopping Nova América. 18:30.

Presenciei algo terrível, indesejado mesmo.

Duas meninas na praça de alimentação. Sozinhas, se entreolham. Parecem cúmplices do erro.

As duas começam a executar o ato. Vejo línguas expostas, mãos e dedos inquietos…

Todos, estupefatos, observavam a indecência.

Sério. Tinha famílias ao redor, crianças por perto.

Uma senhora ao meu lado gritou:

– Isso jamais seria aceito no meu tempo!

Um outro rapaz, mais exaltado, gritou:

– Falta de pai e mãe! Merece tomar porrada!

Eu olhava com ar de descrença… um senhor justificou:

– É carnaval! Vale tudo!

Eu continuava sem acreditar.. dava pra reparar que salivas eram comuns na mesa… as meninas não paravam! Suas expressões corporais denotavam prazer!

Tinha gente observando e curtindo! Talvez…

Eu estava horrorizado. Não combina. Não é natural.

Jamais, em tempo algum, vou aceitar que alguém coma strogonoff com feijão.

Na boa, imoralidade daquelas meninas.

O mundo precisa acabar.

A viagem

As folhas de outono… Me lembro bem.
Ao lado da minha cama, um balde de gelo.
TV ligada, estava assistindo aos Jetsons.
Lá fora, pássaros cantando. Devo estar enganado…
Primavera. Sim, crianças brincando.
Do outro lado da rua, três bulicas para bolinha de gude.
Dever de casa pronto, observava o belo Del Rey do vizinho.
Deitei e fechei meus olhos.
Acordei.
Um, dois.. no total, seis meses olhando os detalhes do teto.
Mais uma vez, fechei meus olhos.
Acordei.
Calor insuportável. 40 graus, um ventilador de teto horrível que girava a uma rotação muito baixa. Mesas rabiscadas e paredes sujas com marcas de tênis.
A calça jeans e a blusa não eram adequadas. Ouvia a propaganda de uma autoescola lá fora.
Dentro, um professor de história entediante que lia um livro de capa verde.
Puro tédio, uma notícia devastadora e o fim da vida anunciado.
E, mais uma vez, fechei os olhos.
Acordei.
Mais três meses observando a estrutura de metal que me cercava pelos lados
Mais uma vez, fechei meus olhos.
Acordei.
Peças de computador, uma estante de livros e um objetivo. Todos os dias, naquela kombi. Caminho perigoso e uma agulhada ao chegar em casa.
De madrugada, pela janela, eu olhava pro futuro, com ódio do passado e determinado a mudar o presente.
Cansado, fechei meus olhos.
Acordei.
Mais seis meses tentando achar padrões de fissura que percebia pelos acabamentos do quarto.
Impossibilitado, fechei meus olhos.
Acordei.
O despertador toca. No meu celular, todos os compromissos que terei naquele dia. Observo o bater das águas próximo.
O destino não está distante e vai ser ali que cumprirei mais um dia. Verde em abundância e uma pseudo sensação de segurança.
Os objetivos foram traçados e cumpridos…
E, esgotado, fechei meus olhos.

Coisas do Irajá

Alguém chama. Apressei-me e atendi.
Uma senhora disse:
– Oi! Pode me dar um dinheiro?
Respondi:
– Por qual motivo?

A argumentação se desenrolou…

– Sou deficiente auditiva!

– Hummm. E como você entendeu o que eu disse?

– Leitura Labial.

Detalhe: eu atendi pelo interfone.

Como são as coisas

Como são as coisas…
Hoje faz um ano que consegui meu título de doutorado…
Ontem, no intervalo entre os tempos, um aluno me perguntava interessado sobre a minha carreira.
Antes disso eu estava explicando sobre as teorias da computação. A aula de estrutura de dados exigia que o aluno entendesse a diferença entre passagem por valor e passagem por referência. Complicado pra quem nunca viu.
Percebi, então, o quanto eles precisam se motivar. Além da minha nada ortodoxa maneira de conduzir uma aula, de vez em quando abordo assuntos correlatos à vida profissional. Exemplos reais e histórias de aplicação sempre com algum humor.
Quando o aluno me questionou, eu não tinha muito tempo para contar tanta coisa por causa do intervalo de 10 minutos. Em voz baixa, superficialmente, falei sobre a minha trajetória.
Seus olhos direcionavam admiração. Percebi alguns alunos tentando prestar atenção ao que eu dizia. Muitos me cumprimentaram. Um deles, “reprimindo” o colega, disse:
– A história do Pablo é quase uma lenda. Ele não conhece?
Dei o restante da aula.
Pensei naquilo que o aluno disse. Lembrei do reconhecimento dos meus alunos e meus pares na Marinha e na Estácio. Fui dirigindo pra casa com centenas de flashes na minha cabeça. De momentos sofridos a outros apavorantes. Euforias, tristezas e voltas por cima.
Uma angústia me abateu. Dos objetivos ou necessidades, me perguntei o que viria agora. Com 34 anos, pela primeira vez, me vi sem gana.
Não que eu tenha conseguido tudo que eu queria. Nada disso. O que aconteceu foi um fenômeno estranho, nada costumeiro. Uma apatia quase baseada numa possibilidade vã de luta.


Os desafios

Os desafios intelectuais existem, mas o físico jamais foi vencido.
A apatia, o tédio e a falta de gana deveriam desaparecer.
É domingo. Após um Hambúrguer com bacon, uma lata de coca-cola e um sorvete sabor diabete, avistei o meu novo desafio.
Vários obstáculos, um caminhar que oferece resistência. Esferas de tamanho homogêneo, apoios para escalada.
Meu amigo, ávido pela emoção, me convidou. Relutei. Achei que era cedo demais.
Lembrei, então, da essência do meu ser. Desafiar-se, jogar-se ao novo.
Fui me cadastrar. Demos os nossos nomes. A moça, preocupada, me questionou:
– O senhor tem certeza?
Meu companheiro acenou com a cabeça.
– Assine esse termo de acordo.
Assinei. Um frio, um medo me acometeu. Prossegui ouvindo, ao fundo, o aviso:
– Senhor, essa atividade é indicada para…
Interrompi. Com certa autoridade, disse para não se preocupar, pois eu estava ciente das condições.
Pessoas me observavam. Com a cabeça, demonstravam reprovação.
Olhei pra fora da arena e vi meus familiares. Torciam por mim. “Vai fundo”, disseram.
O apoio da família é fundamental. Eu fui. Foi ótimo.
Venci. Cansado, em piores condições, olhei pro rosto de felicidade do meu amigo alguns anos mais novo do que eu.
Ao sair, um estalo. Meu joelho? Será que eu…?
Não. Estorei uma bolinha… uma bolinha entre milhares.
Venci, finalmente, o desafio de mergulhar em uma piscina de bolinhas.
Obrigado ao meu sobrinho e amigo. Agora, o céu é o limite. Quem sabe crossfit?

piscinaBolinhas

Fajitas

Acordei e me perguntei o que faltava para eu me consolidar como o “Rodrigo Hilbert” de Irajá, digo, da Ribeira.
Inteligência? Não. Simpatia, também não. Beleza? Muito menos.
Faltava saber cozinhar. Lembrei que com as minhas habilidades de cientista, a minha capacidade analítica e exploratória seria suficiente para este desafio.
Acordei. Pesquisei várias receitas de fajitas. Li vários trabalhos em conclaves especializados. Fiz um survey explorando a ciência gastronômica, com uma tabela comparativa do estado-da-arte da culinária mexicana.
Olhei resultados empíricos…
Apontei hipóteses e objetivos. A metodologia já existia, era a própria receita.
Fui ao mercado. Comprei ingredientes frescos, escolhidos de forma que, ao saborear, anjos tocassem trombetas.
Pia limpa, fogão impecável. Tudo certo. Ingredientes separados em potes distintos, tudo de forma a dar inveja à Ana Maria Braga.
Cozinhei. Seguindo a receita, reproduzi o experimento conforme havia lido em trabalhos correlatos.
Preparei a mesa com cuidado. A apresentação, segundo alguns autores, é indispensável para o sucesso.
Resultado? Falhei miseravelmente.
PS:
Este texto não tem cenas pós-créditos. Ficou uma bosta e pronto. Sem lado positivo.

Nata

Sabe o que é isso? Acho que não.
Fui lá. Meu campus, meu terreno.
É só uma palestra. Não era. É diferente.
Recebi um abraço. Dois. Três. Quatro..
– Quanto tempo mestre!
Um beijo da Mariana .
– Saudades de tu, Pablito!
Abraço do Ricardo…
Abraços apertados da Juliana..
Empenho das doces Thainá e Carol.
É a gente do bem que me fez bem, tipo Alexandro, Alex, Iago, Lucas e Yuri
Coração apertado. Emocionado. Sou coração mole.
-Quando vai dar aula de novo pra gente?
Gentileza da Edith e de tantos outros.
Problemas técnicos.. receio de decepcioná-los.
“Não estou achando sua matéria na grade”, disse uma aluna ao final.
Tudo certo, eu acho.
Dos anseios e conquistas, hoje eu zerei a vida.
Ganhei chocolate, respeito e carinho. Muito carinho.
Hoje quem me ajudou foram vocês.
E você? Sabe o que é isso?
Isso é #Nata.

Centro da Cidade

Centro da cidade. O relógio marca 12:00.
Após uma reunião na parte da manhã, eu tinha que “fazer hora” até o outro compromisso às 14:00.
Andei. Andei pra burro. De saúde nada privilegiada, me arrastava.. os pés doíam, a coluna gritava e alguns sentidos estavam indo embora.
Ali, numa das transversais da 1º de Março, avistei aquele lugar.
Olhei pro lado direito. Uma bela moça na porta.
Atentei o olhar para dentro e vi um estabelecimento que poderia, enfim, me reconfortar.
Tinha bons acabamentos internos e uma decoração razoável. Parecia limpo.
No entanto, vi muitos homens lá dentro com um certo ar de vergonha. Não entendi.
Entrei.. humm.. saquei. Um rapaz, vendo meu olhar atônito, tentou me tranquilizar:
– Venho aqui várias vezes no mês. Elas são ótimas.
Uma outra moça me surpreendeu tocando-me levemente nas costas, dizendo:
– Não tenha medo, você vai gostar.
Fiquei confuso. Lembrei das minhas convicções e valores.
– Eu mereço isso? Talvez.
Relutante, fui acomodado.
Fiquei preocupado, pois eu também não tinha nenhuma proteção.
Meu coração disparou e até suei. As luzes daquele salão me davam um extra-sensoriamento e eu já não agia conforme a razão.
O serviço foi prestado. Um arrependimento me acometeu. Um sentimento de culpa que eu talvez não fosse capaz de carregar sozinho.
A moça, gentilmente, perguntou:
– O Sr. Gostou?
Mais confusão mental. Sim, eu tinha gostado, mas não era errado aquilo tudo?
Como poderia, afinal, um prato de buffet self-service “à vontade” custar R$ 11,90 e ainda ser bom?
O risco valeu a pena. E nem precisei tomar um omeprazol posteriormente.

Em certas ocasiões

O despertador toca. Recuso-me acreditar.
Penso: por que?
Ele insiste: primmm… primmmm (não ligue para onomatopeia sem sentido)
Cansado, demoro a acordar. Demoro para pegar no “tranco”.
Contemplo o nada. Olho para uma meia que o meu cachorro roubou.
Qual sentido?
Mais um dia de trabalho. Relatórios, orientação técnica, uma discussão ali outra acolá.
Ih… tem reunião…
O dia passa… onde iremos comer? Unha suja, Rancho ou Amendoeira? Soube que no Carlitos agora tem prato executivo.
Um café, dois. Três… uma dipirona…
Morto. Mas, tenho que dar aula. Ofício de orgulho, vou para Barra.
Bato ponto. Pego um Pilot e um apagador.
Com olhos vermelhos, bebo mais um café.
Olho pela janela da sala. Dou uma respirada longa… meu desânimo é suspenso.
Vejo aqueles alunos, alguns também muito cansados. Afinal, a maioria deles tinham trabalhado o dia inteiro.
Perseverantes, estavam lá. Querem uma vida melhor.
O que eu posso fazer? Tenho que ser o melhor. Tiro de mim as últimas gotas de energia.
Falo, berro, rio e faço desafios.
Implico e complico para depois descomplicar.
Dou força, dou ânimo e digo que vai melhorar.
Em certas ocasiões dou broncas…
Em certas ocasiões eu erro…
Em certas ocasiões eu aprendo…
Em certas ocasiões eu me emociono.

Vocações ou destinos

Aquela distância, aquele problema
É confuso, incompreensível
Não faz sentido, mas está lá.
O porquê não é claro, mas incomoda
Grita por atitude e por mudanças
Traz angustia, solidão e amargura
Nos faz questionar
Por que comigo?
12 vezes por dia, aquilo me lembra
Um dia terminará… vocações ou destinos
Não existirá mais “porquês”
Não existirá “eu” ou “vocês”

Vale a pena?

Aguardo o dia passar e espero o anoitecer. Ansioso, espero a hora de dormir.

Já reparou como dormir é bom? Ainda mais quando se sonha… Adoro sonhar!

Nos meus sonhos sempre ganho super-poderes. Com estes super poderes posso fazer coisas imagináveis para pessoas como eu.

Posso jogar futebol, correr, andar de bicicleta e até esquecer horários…. incrível!
Infelizmente, contra minha vontade, ao amanhecer meus super-poderes têm acabado.

De longe, prostrado, escuto o som da realidade, um som que me parece cruel, carregado de problemas e me trazendo de volta para um mundo que não é meu, no qual não me sinto bem.

Neste momento, possuo duas escolhas: ficar no mundo dos sonhos com meus super-poderes ou voltar a cruel realidade.

É verdade. Não temos tempo a perder…

Mas, qual sentido da luta? Dinheiro? Felicidade?

Algumas pessoas dizem que você tem que ser reconhecido pelo que você é. Acredito eu, que esta teoria seja impossível de se provar.

As conquistas de nada adiantaram e, mais cedo ou mais tarde, minhas lembranças e meus feitos estarão embaixo de flores e faixas.

Vera, Verinha.

Doce mãezinha, mulher de fibra.
Me educou. Cuidou de mim.
Amor sem limites, acreditou mesmo quando as probabilidades diziam que não era pra acreditar.
Brigou e me pôs de castigo quando fiz bobagens. Joguei termômetro no chão. Joguei futebol. Impliquei com a Paula.
Me carregou literalmente em 629 e 665. As tardes na Tijuca eram de sacrifício. 14 anos de tardes assim…
Pena? Não! Incondicional Amor.
Me beija e me abraça. Diz que estou feio de barba. Ao seus olhos, emagreço e engordo de um dia para o outro.
Ganho roupas do pega-pega de Madureira.
Quando pequeno, ganhei um “Mike” e um “Robook”. Se comportado, um “Le cheval”.
Ah, Mamãe! Algumas vezes, a correria nos afasta. Mas o meu amor sempre será constante. Em Irajá, na Ilha, na Barra ou no Canadá.
Prometo, estarei sempre ao seu lado e com o chinelo desvirado.

Das surpresas do dia-dia

Noite, clima bom. Entrega de provas.
Dou ânimo aos tristes e congratulo os vitoriosos.
Começo o processo de correção da prova. Uma dúvida aqui, outra acolá.
Olho para o corredor. Vejo o diretor da unidade. Vejo, também, outras duas pessoas que o acompanhavam como uma espécie de guardas.
Pensei:
– Caramba, será que vai sobrar pra alguém?
Ele continuava seu percurso. O diretor caminhava em direção a minha sala, que por sinal fica ao final do corredor, olhando pelas janelas o professor que estava na aula.
– Divaguei por alguns segundos… Quem seria o professor que ele estaria procurando?
Um calafrio me acometeu. Fiquei estremecido. Seria eu? O que teria feito de errado? Eu tento fazer tudo tão certinho!
Ele entrou na minha sala. Pediu uma confirmação quanto a minha identidade.
Era eu…
Fiquei nervoso. Não sabia se ia lá pra fora ou permanecia com cara de paisagem. Tentava calcular se a vergonha seria menor ou maior fora da sala.
Ele proclamou:
– Estou aqui pra te falar algo na frente de todos…
Procurei justificativas. Pensei no que poderia ter feito…
– Por que eu?
Ele sorriu. A turma olhava com atenção.
Finalmente, o alívio:
– Parabéns pelo seu desempenho. Você foi um dos professores que melhor foram avaliados pelos alunos.
A congratulações prosseguiram e a recompensa explicada. Fotos, apertos de mãos e mais felicitações!
Claro, fiquei super feliz. Um pouco desajeitado e assustado, é claro.
Eu já havia ganhado este mimo, mas dessa vez o roteiro foi de forte emoções.
UNESA é pra quem tem amor e coração forte!

Me conhece?

Em um dia, fui chamado de:
Sr., Mestre, Doutor;
Psiu, chefe, Plabo;
Coordenador, Gerente, ÔÔÔ
Rapaz, menino, tio
Pablito, professor, Tony Stark
Fabio, colega, de Mulé,
Cara, Tio, Maluco
Chorar? Chorei.

Aparências

Em uma recente conversa com a minha irmã pelo Skype, matávamos a saudade. Dentre amenidades, planos, problemas e possíveis encontros, ela subitamente me interrompeu:
– Pablo, você está parecendo o Padre Fábio de Melo!
Até agora eu não entendi. Ela justificou a colocação por causa da minha aparência, a barba exageradamente por fazer e um possível olhar que eu fazia divagando durante a conversa.
Pensando bem, isso não é ruim. Considerando que eu gostaria de ser o Superman (também tratado com ar de divindade) e o abismo para realidade, um seminário não é tão bizarro.
Ih! Lembrei…tem o celibato. Deixa pra lá. Ser o Padre Fábio de Melo deve ser tão difícil quanto ser o Superman.

O tempo é cruel

Da série “o tempo é cruel”.
Ontem foi a primeira aula dos calouros na minha disciplina.
Os rostos revelavam um ar pueril na meninada. Uns, com cara de assustado. Outros, curiosos, olhavam envolta seus futuros “parças”.
Diferente mesmo. Canetas e estojos novos. Caderno do Ben 10. Lápis e borracha de qualidade, não aquela que esfarela ao apagar.
Pena que no período seguinte tudo se resumirá a tirar uma foto do quadro…
Voltando…
Refrescante ver rostos de 18, 19 anos.
Primeira aula é aquilo: ementa, avaliação e plano de ensino. Rola sempre uma introdução, uma contextualização da disciplina.
Ontem, eu tinha que falar sobre a história da internet. Contexto pós segunda guerra, marcos relevantes e a era da ubiqüidade.
Imagine: 21 horas numa sexta feira. A primeira vista, eu sei que meu rosto não inspira simpatia. Pareço sisudo. Então, mesmo com o laboratório aberto, eles continuavam lá fora. Um se arriscou e pediu pra entrar. Os outros seguiram o herói.
Sim, sexta feira 21 horas. Eu me viro pra manter a aula atrativa. Brinco. Promovo “discussão”. Faço alegorias. Quase planto bananeira.
Daí, você percebe que algumas colocações não fazem sentido para eles. Sugerir, por exemplo, que a internet poderia modificar o sistema político, não comove. Alguns nem tinham votado ainda.
Durante um tempo da minha carreira de professor, eu olhava os outros colegas professores com um certo ar distante. Talvez por estar junto à alma mater, preferia me sentir um “aluno avançado”. Na minha cabeça, meus colegas professores sempre estavam de suéter com aquele olhar por cima do óculos.
Com as minhas piadas ficando descontextualizadas, me senti aquele professor velha guarda de computação. Sabe aqueles que se orgulham de ter programado com cartão perfurado? Quase o tio do “pavê ou pacomê”…
Ah! Os alunos? Sim, o feedback foi positivo. Eles participaram. Ainda arranco risadas, olhares atentos e interesse na disciplina. Mas, a sensação que fica é a de que preciso comprar um suéter.

Antítese

É assim..
A antítese do ser que não coagula…
A manhã ensolarada e a noite de tempestade ruidosa
A confiança plena próxima da fé e a incredulidade com base factual
O preto e o branco
É positivo e o negativo
A vontade de viver e a vontade de morrer…
Há algum tempo, uma homenagem inapropriada. Uma pichação que me considerava “eterno”. Agora, uma reflexão profunda, daquelas que resumem a essência da influência do meu ser…
pablotriste

O “Banner” dentro de cada um

Eu tinha lá meus 8 anos e a minha irmã, 12.

Eu, nerd, com tornozelos, cotovelos e um psoas de irritar, tinha dificuldades de aproveitar a infância. Como qualquer sujeito com desvios padrões altos considerando a normal, tinha dificuldades de me encaixar. Eram comuns aqueles deboches e preconceitos.

Mas essa história não é sobre mim, mas estou intrinsecamente relacionado.

A minha irmã, a mais bonita da rua, a mais inteligente. Sempre foi ótima aluna, filha dedicada e irmã leal.

Tinha muitos colegas, mas rapidamente desfazia qualquer relação caso eu fosse o alvo. Ao se deparar com qualquer injustiça comigo, ela comprava briga, virava bicho!

Mas, nem ela, estava livre das maldades juvenis. Um grupo de meninas (obviamente eu não vou citar os nomes) implicava reiteradamente com ela. Todos os dias, esse grupo de meninas a cercava e a ameaçava de lhe aplicar uma surra.

Eu me lembro desse dia. Como me lembro…

IAPC de Irajá. Berço das crônicas suburbanas, quase um curtiço high level. Somos orgulhosos da origem.

Era mais ou menos 10 horas da manhã (eu tenho memória eidética). Era ali, na frente do muro da Dona Geralda, perto do Cantinho da Amendoeira.

Estava um sol de rachar. Numa rara oportunidade, era sábado e eu pude descer.

Eles estavam prestes a iniciar alguma brincadeira. Lembro que minha irmã gostava de me incluir nas brincadeiras me colocando como café-com-leite.

Podia ser um dia (a)normal, mas não foi.

Aquele grupo juvenil a cercou. Atônito, vi aquela cena. Me sentia impotente.

Era a minha vez. Claudicante, corri pra casa, passei de forma soturna pelo meu pai. Não falei nada.

Abri o guarda roupa, peguei um cinto do meu pai – sabe esses cintos de couro legítimo com uma fivela grande?

Então… O tempo de “turn around” foi suficiente para que quando eu chegasse, visse minha irmã atracada com a dita cuja.

Não hesitei. Corri pra cima da nossa inimiga. Apliquei-lhe cintadas com toda força que eu tinha. Não parava! Confesso um urro, como Leônidas, enquanto a golpeava.

Me lembro de me retirarem. Criança, fui suspenso por um adulto, sendo retirado de cima da vítima que estava deitada. Minha memória me remete a uma altura absurda.

Veja, não me orgulho disso. Eramos crianças, todos os envolvidos.

Mas era a minha irmã, sabe?

A vida toda ela ia me dar tantas provas de amor…

Eu te amo, Paula Johnson. Faço qualquer coisa por você.

Nós vencemos. Mas não por causa daquele dia, não por causa das cintadas.

Vencemos por causa da nossa história.

Rio de Janeiro e seus dias, parte 1

Antes de tudo, leia mas não fique preocupado. Passou. É engraçado até.

Um dia qualquer. Muito trabalho, uma gripe e uma felicidade transbordante por cumprir mais um dia da minha rotina.

Produzi, ri, matei mosquitos e resolvi problemas pessoais. Enfim, mais um dia.

Estava eu dirigindo para a universidade onde sou professor. Na linha vermelha, no engarrafamento, sob o buzinar desvairado das motos, meu olhar perdido no batalhão da polícia e os anúncios de biscoito Globo, tomei uma decisão. Decisão costumeira, daquelas que você toma todos os dias: comer no Bob’s ou no MC Donalds? Assistir uma série ou um filme? Pizza ou cachorro-quente? Utilizar Padrões de Projeto ou ir no Stack Overflow?

Eu tinha que pegar a linha amarela. Sim, eu tomei a decisão. Decidi evitar mais engarrafamento e “cortar” pela comunidade.

Uma rua estreita, um carro no meio da pista e um pouco de imperícia… Bang! Arranquei um retrovisor fora. Olhei para o lado direito. Meu retrovisor apenas se retraiu.

O retrovisor atingido com gravidade não era o meu. O pior tinha sido reservado para o colega: quebrado, estatelado no chão sob o olhar do proprietário da moto, carregado de ressentimento e incredulidade.

Reação natural, parei mais a frente. A culpa não era só minha. Afinal, aquela moto estava um pouco para rua. Vi pelo retrovisor meu oponente se aproximando. Percebi que o mesmo carregava consigo, digamos, uma proteção adicional. Ele caminhava. E eu, aguardava. Naquele caminhar, lembrei de Rocky enfrentando Apolo Creed. Lembrei de Luke derrotando o Imperador. Lembrei de Davi e Golias. Lembrei até mesmo de Seya elevando o cosmos. Ora, se eu fizesse como Daniel San em “Karatê Kid”, o que poderia me deter?

Em microssegundos minhas sinapses produziram a resposta correta. Abaixei o vidro. Ele colocou a cara na janela. Não hesitei! Na mesma hora, lhe disse, com a coragem de um Jedi:

-A culpa é minha. Eu pago.

Ele mudou a feição. Olhou pra mim, um tipo esquisito. Então, proferiu:

– Tá tranqüilo. (Não, ele não disse tá favorável).

Fomos numa loja que tinha ali perto. Perguntei o preço e o rapaz me disse: 24 reais. Dei os 24 reais e o vendedor me alertou:

– 24 é o par. Você só quebrou um.

O novo retrovisor me custou 12 reais.

Fui embora. Fui cumprir minha rotina. Fui embora feliz.

Feliz porque tenho uma família, estou bem e vivo.
Feliz porque tenho saúde e isso me permite trabalhar muito.
Feliz porque eu tinha 12 reais.

Rio de Janeiro e seus dias, parte 2.

pablomorre
Há pouco tempo eu havia contado sobre um pequeno incidente numa comunidade que é paralela à linha amarela. Nesse incidente, arquei com um prejuízo que não era meu. Coagido por uma arma de fogo, assumi um pequeno prejuízo cuja culpa não era minha.
Se quiser lembrar, dá uma pesquisada na parte 1.
Sim, eu sou teimoso. Hoje quase deu merda, de novo.
Olhei pro relógio e vi que horas eram: 17:45. Eu faria parte de uma banca de projeto final às 18:00. Atrasado, pensei na ansiedade dos alunos.
Estúpido, tomei a decisão novamente.
– Vou cortar caminho.
Peguei o caminho pela comunidade. Atentei-me com a perícia de um Senna. Diminui o volume da música para que nada me distraísse.
Camila Siqueira, amiga que no momento pegava carona comigo, me olhou estranho. Costumeiramente ela cantarola qualquer música que esteja tocando: axé, rock, ópera ou mesmo funk. Naquela hora, ela não compreendeu o porquê da interrupção.
Como um bravo, prossegui. Sou de irajá, ‘tô safo’. Um carro não queria deixar eu passar, passei. Um prelúdio? Um aviso?
Mais a frente, dois homens. Dei de cara com eles. Um com uma pistola na mão. O outro, segundo a Camila, um fuzil.
A Camila proferiu:
– Pablo, dá ré.
Não dava. Avaliei a situação. Eles apontaram as armas para outro carro que vinha rua transversal. Eles pareciam que iam atirar.
Encostei suavemente no canto. Não tinha o que fazer. Gelei. A melhor hipótese era se abaixar dentro do carro.
Nem fiz isso. Eles liberaram o outro carro. Imaginei, então, que seria uma “blitz”. Isso mesmo: bandido fazendo blitz.
Acendi as luzes internas, baixei o vidro. Nem me atrevi a olhar na cara do sujeito.
Passei, sobrevivi. De colateral, um início de crise de pânico. A Camila, ficou mais branca do que normalmente é.
Lembrei-me do quão estúpido eu sou. Lembrei-me do spoiler de ontem sobre uma série de TV (“Pablo Morreu”).
Lembrei do amigo Marcelo Dsr dizendo que sou pára-raios de problemas.
É amigos. De vez em quando quebra na solda.

Javeiros

Noite fria.
Campus deserto.
Sem alma, dor ou ardor.
No entanto, o encanto.
É ele de boné.
Sorriso largo, corpo esguio.
Sim, é o Marlon.
Ávido pela Av3. Ávido pelo sabor da vitória.
Javeiro, pegador, destruidor. Marlon.
Um desânimo abateu. Av3 na terça?
Com tristeza a informação recebeu.
A noite deixou de ser doce.
O céu escureceu
A menina vitória atrasou-se.
Hoje não há public, get ou set.
Sem collection. Sem iterator.
Sem sorriso. Sem amor, sem ardor.